Direção, roteiro e edição: Paulo Biscaia Filho
Pensava em como começar esse texto pela enésima vez quando finalmente percebi o que estava me bloqueando: tudo é absolutamente respeitável neste delicioso passeio pela ladeira da memória cheio de referências à literatura Pulp, cinema Noir hollywoodiano clássico, os também clássicos Monstros da Universal, quadrinhos, entre outras coisas e os fracassados de qualquer lugar, no caso, John Clayton (Ed Canedo), um ex-policial agora detetive que equilibra as contas participando de lutas de boxe ilegais. Ele foi criado num orfanato e sua esposa foi morta por um assassino misterioso em um caso nunca desvendado.
Sim, a vida de John Clayton é um balaio de misérias, não fosse por Vonetta (Caroline Roehrig), a sua fiel e bastante misteriosa secretária, o abismo para o qual a sua vida sempre apontou teria chegado mais cedo, mas, ele chega e chega na forma de Helen Zola (Michelle Rodrigues), uma viúva de marido vivo que o contrata para descobrir se o seu cônjuge, Anton Zola, a corneia. Tudo muito clássico, mas, lembrem do abismo citado há pouco, absolutamente nada nessa investigação vai levar Clayton à normalidade, o que começa com a suspeita de uma cabeça enfeitada de robustos chifres, aos poucos mostra o lado obscuro da Curitiba de 1959, afinal, está é A Macabra Biblioteca do Dr. Lucchetti e ela só abriga volumes escritos em sangue e mistérios, muito similar, óbvio, à obra real do verdadeiro Lucchetti, a saber, Rubens Francisco Lucchetti ou R. F. Lucchetti, um dos escritores mais prolíficos do nosso país, também é chamado de “o pai do Pulp brasileiro”, o homem tem centenas de livros lançados e é também roteirista, tendo trabalhado com José Mojica Marins em diversos filmes, parceria que foi encerrada após o autor assistir um filme feito baseado em um roteiro seu e perceber que o que se passava na tela em nada ou pouco lembrava o que ele tinha escrito, terminando assim uma parceria que poderia ter sido lendária, mas, essa é uma outra história, voltemos ao supracitado John Clayton, que acaba descobrindo que o alvo de sua investigação, o Dr. Anton Zola (Kenni Rogers), é um cientista e até aí, tudo bem, o problema é que ele é louco e até aí, tudo bem também, porque ninguém escolhe sê-lo, mas, Zola é nazista, um saco de excrementos ególatra com pouco mais de um metro e meio de altura oriundo do exército alemão (estamos em 1959, lembrem) e ideias muito pessoais sobre o que fazer com o vasto conhecimento que possui, ou seja, John Clayton tem uma luta dura e esquisita pela frente, o problema (porque sempre existe um) é que todos os personagens principais d’A Macabra carregam segredos nebulosos, nenhum tão nojento como os de Zola, mas, igualmente complicados e cabe ao nosso corajoso detetive resolvê-los, coisa que ele vai perceber ser difícil quando a carne encontra inimigos mais duros do que ela.
Lançado inicialmente em formato episódico e depois editado como um longa, A Macabra Biblioteca do Dr. Lucchetti foi totalmente filmado em tela verde, os cenários virtuais são caprichados, assim como os efeitos especiais, som, cinematografia, figurino, roteiro e atuações, tudo muito respeitável, como dito antes, abraçando o estilo inconfundível impresso pelo diretor neste e em outros trabalhos e por falar nisso, é bom que se saiba que Paulo Biscaia Filho é um dos diretores mais atuantes do terror brasileiro, a Vigor Mortis, sua produtora, atua no mercado há mais de vinte e cinco anos e seus trabalhos incluem peças de teatro, performances nas ruas, cineclubes, podcasts, filmes, série de tv e HQs. Fora da produtora é Magnífico Reitor da UniHorror, iniciativa online com cursos sobre cinema de gênero por onde já passaram vários nomes de diversos braços do horror nacional. Aconselho uma visita ao canal da produtora no YouTube, onde não apenas A Macabra Biblioteca do Dr. Lucchetti, como Morgue Story: Sangue, Quadrinhos e Baiacus e As Virgens Acorrentadas, outros filmes do diretor, estão disponíveis na íntegra, além de outros trabalhos desenvolvidos por ele, como a leitura de algumas obras de Edgar Alan Poe, escritor por quem Biscaia nutre devoção (errado ele não está) e debates com outros estudiosos do horror sobre filmes específicos. Recomendo fortemente uma visita lá.
Comentários
Postar um comentário