#82 O Despertar dos Mortos (1978)

Dawn of the Dead

Roteiro e Direção: George Romero

(EUA/ITA – 1978, Cor, 127 minutos)

Elenco: Ken Foree, Gaylen Ross, David Emge, Scott H. Reiniger, Richard France, Howard Smith, Joseph Pilato, Mike Christopher, Pasquale Buba e Tom Savini, entre outros e outras.

Esse texto vai ter um problema, ele vai ser apaixonado e ponto final. O motivo: este filme me acompanha há décadas, me ensina, fortalece e nunca me decepcionou em suas muitas revisões, revisões, diga-se de passagem, nunca programadas, o filme simplesmente “me chama” e antes que eu perceba, estou mergulhado outra vez em um mundo em drástica transformação onde nada mais será o mesmo.

Se em A Noite dos Mortos-Vivos (1968) a ação acontecia numa fazenda no meio do nada na Pensilvânia, onde, além dos zumbis, os personagens tinham que sobreviver uns aos outros, aqui em, O Despertar dos Mortos, os horizontes são expandidos, vemos que os zumbis tomaram os centros urbanos, com a história se iniciando no estúdio de uma rede de televisão, que rapidamente nos contextualiza do que está acontecendo: o mundo está acabando, os mortos e mortas voltaram à vida com voraz apetite para carne humana, e as pessoas que eles matam também voltam à vida, num ciclo crescente e aparentemente, sem volta. Informações desencontradas junto ao pânico nas ruas faz com que os personagens principais rapidamente se tornem o que realmente somos: animais que precisam sobreviver.

Se o ambiente se tornou hostil, exterminamos quem o deixou assim e, se quem o deixou assim for numeroso demais, abandonamos o lugar e encontramos outro que atenda às nossas necessidades e dessa maneira, George Romero, num dos maiores tapas sem mão da história do cinema, leva um insólito quarteto a se isolar em um shopping center, transformando-o em sua fortaleza particular e usufruindo das benesses que lugares assim podem oferecer quando do lado de fora está a acontecer o apocalipse. Comida, água, roupa, acessórios do lar, livros, remédios, sistema de som integrado e armas e munição, claro, porque sem isso fica difícil sobreviver às criaturas que salivam quando nos veem e não reconhecem mais nada, a não ser o desejo de aliviar uma fome que não passa, numa cópia crua do que talvez já sejamos, mas ainda não nos demos conta.

Os nossos heróis e heroína são Peter (Ken Foree) e Roger (Scott H. Reiniger), dois membros da SWAT, Stephen (David Emge), piloto de helicóptero e Fran (Gaylen Ross), uma jornalista grávida. Unidos pelo acaso, eles abrem caminho através dos zumbis até se abrigarem num oásis moderno do consumo, que, pela enormidade do lugar, não faz com que as relações se deteriorem, afinal, ali não falta o que fazer, desde criar barricadas em ações que os expõem aos devoradores, como tirar de lá de dentro alguns deles que porventura ainda estejam a zumbizar, além de ter de ficar alertas para a pior das ameaças, os vivos, na figura de uma gangue de arruaceiros que também percebe as inúmeras vantagens do shopping. Não bastasse ser um terror de primeira qualidade, as leituras que se podem fazer do filme transformam O Despertar dos Mortos numa experiência surpreendente por estar à frente do seu tempo em diversos pontos, como por exemplo, o  protagonismo de um personagem negro, coisa não muito comum na época, ou a saga de uma mulher que, cercada pela morte, carrega em seu ventre um exemplar de uma raça francamente em extinção entre as vitrines coloridas de um templo de ilusões, até a magistral explicação do porquê da insistência dos mortos-vivos em querer entrar ali.

Um filme onde morrem gentes mortas, gentes vivas e gentes mortas-vivas, se bem que chamá-los e chama-las de “gente” depois de um certo estágio não faça sentido, mas eles morrem mesmo assim. E matam. Transformando suas vítimas em integrantes de suas hordas e é isso o que nos interessa.





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