Talvez nosso imaginário tenha sido configurado para acreditar somente em um tipo de sereia graças aos desenhos e filmes fofinhos da Disney. A “mermaid” como aquela sereia amorosa, amigável e romântica que sofre e abandona tudo em busca de viver um amor com um príncipe. No entanto, existe também uma outra palavra que define bem o tipo de sereia que povoa o filme de hoje, é a “siren”, as sereias que seduzem homens para morrerem afogados no mar. Se bem que, pensando direitinho, muitos filmes que já vimos já retrataram esse tipo de sereia, digamos, mais malvada, inclusive se assemelhando muito também a uma figura do nosso folclore, a Iara ou Mãe D’agua, que vive no rio amazonas e também seduz homens, geralmente pescadores, para morrerem afogados depois de se apaixonarem.
A Atração, filme polonês de 2015 dirigido por Agnieszka Smoczynska, é um musical de terror que adapta e reformula o conto original da pequena sereia de 1837 escrito por Hans Christian Andersen. A diretora mistura a fábula e suas experiências pessoais para contar a história de duas sereias que emergem das águas para se apresentarem numa boate com uma banda. Só que uma delas se apaixona pela vida humana, por um homem e quer largar sua vida subaquática assim como também sua cauda, só que sempre tem um porém.
Tudo é ambientado em algum momento da década de 1980. Golden e Silver, as sereias cantoras, estão numa praia da Polônia e escutam uma banda de rock chamada Figs n’ Dates tocando em um momento de relax. As sereias começam a cantar junto e a banda passa a incluir as duas nas apresentações do grupo. Só que tem um problema, na verdade dois, enquanto elas estão secas fora d’água, suas caudas somem dando lugar a duas pernas como qualquer anatomia humana, só que basta cair alguns pingos de água que a cauda das duas logo, logo aparece.
A banda começa a ganhar mais fãs e se popularizar à medida que as apresentações com as sereias acontecem, afinal, todos querem ouvir o canto delas, só que aí começa mais outro problema e esse bem maior, Silver se apaixona por um dos integrantes da banda e Golden passa a ter crises mortais de ciúmes. A forma que ela manifesta esse sentimento, não é nada legal e é quando o filme ganha contornos monstruosos e violentíssimos. Na verdade, a gente que ganha, né, porque esse filme é muito maravilhoso e uma vez que você assiste, vai querer assistir de novo e novo outra vez.
Ele é um filme muito assertivo quando mistura dois gêneros num só e sabe bem dosar os dois, geralmente não costumo escolher musicais para assistir “ah, hoje tô com vontade de ver um musical, qual escolherei?”, não, jamais farei isso, mas às vezes cai de dar certo e esse deu. Além disso, o filme trata de algumas camadas bem sensíveis às questões femininas como o abandono de sua essência em busca de algo construído pelo patriarcado. É o que faz Silver, enquanto Golden, que rejeita a todo momento a humanidade, tenta a todo custo fazê-la desistir da vida humana. Como castigo pela escolha, Silver acaba perdendo a voz.
Gosto bastante de como a construção do grotesco se dá nas personagens quando abraçam a selvageria e seus dentes crescem como garras se misturando ao monte de sangue coagulado, são momentos de verdadeira angústia, pois é sentido que elas têm o poder de matar qualquer um sem pestanejar. Há também um claro diálogo entre as personagens e as cores no filme em tons de verde e azul nos fazendo lembrar sempre que estamos diante de uma história marinha. No entanto, esse horror do grotesco em A Atração, dá espaço rapidamente a tristeza que é o final de Silver e não vou contar aqui para não estragar sua experiência com esse filme
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