#268 Chernobyl - Sinta a Radiação (2012)


Chernobyl - Sinta a Radiação

2012 -USA colorido, 93 minutos

Direção: Bradley Parker

Roteiro: Shabe Van Dyke, Carey van Dyke e Oren Peli

Elenco:Jesse McCartney, Devin Kelley, Jonathan Sadowski, Olivia Taylor Dudley, Ingrid Bolso Berdal, Nathan Philips, Dimitri Diatchenko, entre outros.

Eis que vos trago a encruzilhadas e dilemas onde o “não gostei” se confunde inúmeras vezes com o “não é bom” e ao final, pode-se acabar gostando do que viu ao mesmo tempo em que as inconsistências gritam em nossas lembranças. O cenário da trama é Pripyat, cidade ucraniana atingida pelo pior acidente nuclear da história nos anos 1980 que até hoje exibe índices de radiação alarmantes.

Situada a quase novecentos quilômetros de distância de Moscou, Chernobyl, oficialmente Usina de Energia Nuclear Vladimir Ilyich Lenin, no norte da Ucrânia, era responsável por, entre outras coisas, a produção dez por cento da energia elétrica fornecida no país, e Pripyat, uma cidade planejada que tinha mais de treze mil apartamentos e quase cem hospitais que abrigava trabalhadores e trabalhadoras da usina com seus familiares, aproximadamente cinquenta mil almas. Em 26 de abril de 1986, durante um teste de segurança, uma explosão ocorreu em seu núcleo, dispersando nuvens radioativas por dezenas de quilômetros ao redor. A causa? Falhas na estrutura do reator e humana. No primeiro momento, as ordens de Moscou foram para minimizar os danos perante a opinião pública, mas, a situação se tornou insustentável, restando à então potência comunista admitir as reais proporções do acidente. Dezenas de pessoas morreram por causa da exposição direta à radiação e outras dezenas de milhares sofreriam os efeitos dela nas décadas vindouras, fora a dispersão via ar por uma parte considerável da Europa. Pripyat, com a ajuda do exército, foi evacuada, ficando pouca gente pra trás, como alguns moradores das cercanias rurais, por exemplo e desse modo, um lugar antes habitado por dezenas de milhares de pessoas transformou-se numa cidade fantasma, que com o passar dos anos foi tomada por plantas, formando um contraste entre vida e a morte que não nos passam despercebidas, num cenário pontuado por construções de arquitetura modernista cercado por um silêncio pouco natural, uma tipo de ausência de som que parece anunciar o perigo invisível existente, como percebe-se em documentários e reportagens em vídeo sobre o tema abundantes na internet, um cenário perfeito para filmes de horror em mais um caso onde uma triste realidade supera em muitíssimo a melhor das ficções. Obviamente isso não passou despercebido aos produtores de filmes, afinal de contas, a radiação e seus efeitos há muito é um tema trabalhado no cinema, em especial no cinema de ficção científica norte-americano dos anos 1950, e não foi diferente com Chernobyl, que desde aquela data já teve filmes e séries dedicados ao assunto, em sua maioria com viés de justa denúncia, como The Voice of Ljudmila (2001), Chernobyl 3828 (2011) e The Babushkas of Chernobyl (2015), além da premiada série Chernobyl (2019), da HBO. O acidente foi tão tóxico e traumatizante que anos depois viraria adjetivo para relacionamentos idem. 

O ano era 2012 e Oren Peli, produtor e roteirista desse filme, colhia os frutos possibilitados pelo sucesso absoluto de Atividade Paranormal (2007), que incluíam três sequências e participação como produtor em Sobrenatural, dirigido por James Wan em 2010 e The Bay, dirigido por Barry Levinson em 2011, além da série de televisão The River, exibida pela ABC, que teve apenas uma temporada com oito episódios. Em comum entre esses trabalhos, menos a série, o baixo orçamento, que, com exceção do injustiçado The Bay, deram excelente retorno financeiro para os envolvidos e isso não foi diferente com Chernobyl – Sinta a Radiação (Chernobyl Diaries, ou, Os Diários de Chernobyl, título que também não faz jus ao filme), que lucrou quase trinta e oito milhões de dólares, tendo apenas um milhão deles como orçamento. 

Aqui, um grupo de jovens a passeio pela Europa, convencidos por um deles a ir na supracitada Pripyat no lugar de Moscou, sua próxima parada na viagem, numa excursão que se vende como radical, quando na verdade é apenas muito perigosa. Uri, o guia, é um ex-soldado das forças especiais que, ao ter o acesso dele e dos turistas negado por soldados que chegaram de surpresa ao local, os leva até a cidade por um outro caminho, onde logo descobrem que alguns animais já exibem visíveis deformações (ou evoluções, diriam alguns) e ao chegar na cidade propriamente dita, se deparam com o cenário antes desenhado nesse texto. O filme teve locações na Sérvia, Hungria e na própria Pripyat e a direção se aproveita bem das atmosferas lúgubres desses locais, filmados a parecem únicos, com seus prédios residenciais que gritam silêncios entre o degradê das plantas e a luz própria do lugar, que exala beleza apesar de ter sido palco de uma tragédia coletiva com imensos impactos individuais, ao mesmo tempo em que não conseguimos relaxar, pois sabe-se lá o que se abriga ou se esconde nas janelas do lugar e é essa curiosidade mórbida que move os personagens, um grupo totalmente sem graça com o qual não criamos a mínima empatia e apenas esperamos o momento certo em que coisas ruins acontecerão com eles, afinal, este é um filme de terror. Após um passeio de várias horas onde em vários momentos os visitantes e as visitantes desrespeitam o chão que pisam, um ataque inesperado faz com que, assustados e assustadas, eles e elas decidam retornar ao carro e à segurança da cidade, mas, ao chegar no automóvel, descobrem que o mesmo foi sabotado e agora estão ilhados enquanto a noite se aproxima rápida, trazendo com ela desagradáveis surpresas que carregam consigo comportamento bestial. Divididos quanto ao que fazer, as ações do grupo levam a desordenados planos de sobrevivência que pioram a cada decisão tomada. Seria este um grande filme de horror se melhor tivesse utilizado das boas sugestões apresentadas, mas, falta-lhe timing em muitos momentos e o artifício da câmera na mão aliada a diálogos pobres evidenciam a falta de inspiração mostrada, não tivessem os roteiristas economizado nas ideias, este seria um filme pleno de medos e possibilidades, mas, preferiram uma não-ousadia que, apesar do sucesso financeiro absoluto, refletiu sim nas bilheterias, que nem de perto se iguala às arrecadações das outras produções de Peli até ali.

Mesmo com tudo isso, Chernobyl - Sinta a Radiação e seu horrendo título em português teve o poder de acender em mim algumas coisas que acabaram por me fazer relevar os pontos fracos e aproveitar ao máximo os momentos passados naquele labirinto de prédios e corredores abandonados que um dia já foram lar de pessoas que tiveram seus planos, para dizer o mínimo, anulados literalmente de um dia para o outro. Acho que é magia do cinema que chama, para o bem e para o mal. Jéssica Reinaldo, também escritora deste vosso estimado blog, diria “Vai com Deus!” e eu emendo dizendo “Oremos”.




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